sábado, 8 de fevereiro de 2014

Triste Catarina



Hoje falo-vos também de uma rainha à qual a história me emociona imenso - D. Catarina de Bragança. 
D. Catarina de Bragança nasceu em Vila Viçosa, no Palácio Ducal, em 1638, data importante por ser dois anos antes da Restauração. O Duque de Bragança, dois anos após o 1º de Dezembro iniciou uma revolução portuguesa que restaurou a independência do país e tornou-se Rei.
Enquanto lá residiu, D. Catarina teve uma infância feliz, mesmo que com uma saúde débil. No entanto, o seu pai, D. João IV, morreu prematuramente, ficando D. Luísa de Gusmão, sua mãe, como regente numa altura em que Portugal estava em guerra com Castela - Espanha que, naturalmente, não aceitou que Portugal declarasse a independência, atacou incessantemente o território português - anos terríveis para a História de Portugal.
No meio de tanta instabilidade, em 1660, tendo D. Catarina cerca de vinte anos, D. Luísa de Gusmão utiliza o trunfo do matrimónio com o futuro rei de Inglaterra, Carlos II. Este matrimónio garantia uma aliança que protegeria Portugal, porque se os Ingleses apoiassem o país, os Espanhóis não o atacariam, mantendo assim Portugal independente.
A proposta de matrimónio enviada a Inglaterra incluía um dote espantoso e aqui vemos, realmente, a habilidade de D. Luísa de Gusmão: Se Carlos II casasse com a jovem menina recebia de imediato uma quantia de 500 000 libras de ouro - numa altura em que Portugal passava por uma autêntica crise. Para melhorar a situação, Carlos II não tinha muito dinheiro (não que Inglaterra não fosse rica, o Rei é que nutria uma simpatia excessiva por mulheres e descontrolava-se nos gastos e, portanto, o Parlamento não lhe dava muito dinheiro) e este dote persuadia-o.
Além da grande soma, Portugal concedia a Inglaterra a cidade de Tanger, que fica muito perto do estreito de Gibraltar (cidade que os Ingleses só conquistaram em 1704). Se os Ingleses tivessem uma base naval em Tanger, controlavam a entrada e saída de navios do Mediterrâneo, bem como grande parte do comércio.
As ofertas não ficaram por aqui, porque os Portugueses ofereciam ainda a importante cidade de Bombaim (Mombai), na Índia. Os Ingleses, que iniciavam nesta altura os seus projectos de expansão, viram aqui uma mina de ouro, até porque não possuíam nenhum território na Índia e foi este o ponto de partida, creio, para o grande Império Britânico na Índia. Todas estas ofertas foram adicionadas à também concedida liberdade de comércio no Brasil. Extraordinário! Portugal deu de mão beijada a Índia, o Mediterrâneo e o Brasil!
Com todas estas ofertas, o casamento real estaria garantido, não fosse pelo facto de Espanha ter interferido. Espanha, que sabia o que Portugal pretendia com a união e que riscos corria com a oferta de Tanger, informa, erroneamente, o rei Inglês que a Infanta com a qual se pensava casar era feia, medonha. Portugal respondeu ao ataque enviando um retrato da Infanta e, assim, deu-se finalmente o matrimónio, em 1661, mais pelo dote que pela beleza. D. Catarina torna-se então Rainha de Inglaterra, esposa de El Rei D. Carlos II. Mal sabia a pobre rainha o futuro triste que a esperava.
Carlos II, filho de Carlos I, era conhecido como sendo sereno, com boas qualidades e recebeu D. Catarina muito bem (elogiando, principalmente, os seus olhos e a sua doce voz).
De início, as coisas correram bem. No entanto, não muito depois do casamento, D. Catarina descobre a infidelidade do seu esposo, sofrendo um grande golpe emocional. As traições não tiveram fim e justificaram-se pela diferença de sociedade e costumes - era habitual para um rei inglês ter as relações que entendesse. À luz da época, um casamento servia para gerar herdeiros para o trono, não se comparando com as necessidades fisiológicas de um homem. Mas não houve nenhuma razão nem justificação que convencesse a rainha e, durante anos, o rei e a rainha não se falaram.
Anos passados, as amantes tornaram-se amigas da rainha e a sua relação com o rei compôs-se. Mas aí começam outros problemas. D. Catarina era Católica e, no contrato de casamento, estava claro que a rainha não seria impedida de praticar a sua vida religiosa. Mas a Inglaterra era Protestante. Por isso, iniciou-se uma conjuração contra a rainha - a conjuração papista. Diziam que D. Catarina tinha planos de matar o rei para que o irmão deste, Jaime II, que era católico, o substituísse.
Este plano não correu bem e começaram, então, a espalhar o boato de que D. Catarina, que não conseguira ainda gerar um herdeiro para o trono, fazia abortos para que Jaime II subisse ao trono. Uma outra conjuração, porque D. Catarina tinha uma saúde muito débil e não conseguia levar a avante as suas gravidezes, que foram três ao todo. D. Catarina mostrava-se sempre inconsolável. A Inglaterra estava toda virada contra a pobre D. Catarina. Não obstante, Carlos II teve uma atitude sublime: não acreditou numa única palavra, acreditando sim sempre na sua esposa.
Carlos II morreu em 1685 e sucede-lhe, pois, Jaime II, seu irmão. Este quis impor novamente a religião católica em Inglaterra, contudo o novo rei viu-se a braços com uma Inglaterra poderosíssima e foi obrigado a fugir. Fugindo o rei, fica D. Catarina desamparada e, crendo ela, em perigo. A rainha pede a seu irmão, D. Pedro II, rei de Portugal, para que a auxilie no regresso a casa, mas não teve efeito. Depois de viúva ainda passou lá sete anos, até que finalmente, já idosa, consegue voltar a Portugal sem ajuda e por terra, uma viagem que durou meses. Chegando a Lisboa compra um terreno e manda fazer um palácio, onde viveu o resto dos seus dias, até 1705 -  o Palácio da Bemposta. Este edifício foi herdado pelo seu irmão que por sua vez deixou para seu filho, D. João V. Depois de muitas voltas tornou-se no que Lisboa hoje conhece como a sede da Academia Militar.
Uma curiosidade muito interessante é facto de ter sido D. Catarina de Bragança a introduzir o costume em Inglaterra de tomar chá às cinco horas. Chá esse que era importado das colónias portuguesas.

Foi também uma mulher que prestou grandes serviços a Portugal; foi por sua intervenção que vieram a Portugal as tropas inglesas que permitiram a Portugal acabar triunfalmente a guerra da Independência. Contudo, mesmo depois de falecida, a sua memória não é justiçada. Foi uma princesa e rainha triste tanto na vida como na morte.

Nesta imagem podem ver D. Luísa de Gusmão, D. João IV e Carlos II de Inglaterra

Aqui podem ver alguns pormenores da Igreja/Palácio da Bemposta




2 comentários:

  1. Sem dúvida foi a vida dela foi uma tragédia.
    Mas pelo menos Portugal usufruiu disso. Sendo assim ela é quase uma mártir.
    Gostei do texto. =)

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  2. Uma rainha admirável. Gostei do trabalho, continua.

    Cármina

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